Um dos painéis da programação do FIRE 2023 traz um tema que interessa a todo empreendedor digital. Só que esse encontro não é para falar exatamente sobre insights de sucesso, mas sim discutir um fator que tem muito impacto no dia a dia de um criador de conteúdo: a saúde mental.
A palestrante do painel é a jornalista Issaaf Karhawi. Doutora em Ciências da Comunicação pela USP, Issaaf pesquisa processos profissionais de influenciadores e creators – área em que é considerada uma das principais referências acadêmicas no Brasil.
Um dos estudos recentes que Issaaf desenvolveu traz
uma análise sobre exaustão algorítmica. Sabe o que isso significa? Com a dependência profissional que muitos especialistas criaram das plataformas de mídias sociais, ficar à mercê das mudanças inesperadas que as redes provocam nos seus algoritmos para disseminação de conteúdo tem prejudicado a saúde mental de muita gente.
Para explicar um pouco desse estudo, a pesquisadora bateu um papo com o ONFIRE e adiantou um pouco da conversa que vai apresentar no palco do FIRE FESTIVAL, em Belo Horizonte.
ONDE TUDO COMEÇOU
A gente não consegue mais escapar das redes sociais. Elas fazem parte da nossa política, do nosso dia a dia, da nossa profissão. E Issaaf defende pontos positivos nisso.
“As plataformas oferecem um espaço para pensar, formas criativas de atuar, novos espaços para para produzir conteúdo e para disputar também. Nela tem muitos discursos que circulam, e cada criador que decide começar a produzir conteúdo na internet disputa também um pouquinho desse espaço. Ele quer colocar também ali um novo ponto de vista na conversa”, afirma.
O desenho dessas plataformas vem de uma ideia de cultura participativa, que começou ainda nos anos 1990. A popularização da internet abriu o polo de produção: agora todo mundo pode produzir conteúdo, não só a mídia tradicional. Dessa forma, os criadores de hoje nada mais são do que filhos desse projeto de rede.
“Essa é uma cultura em que não é preciso pedir licença a ninguém para entrar e produzir. E isso não surgiu por causa da Meta ou do TikTok. Essa cultura permitiu a gente ter hoje uma pluralidade de vozes. Foi por conta disso que a gente conseguiu mudar a cara da mídia, mudar a cara da comunicação. Então tudo isso é maravilhoso. Não dá para negar.”
TRABALHO AUTÔNOMO?
Muita gente decidiu fazer da rede social o seu local de trabalho. E um dos desejos de quem decide trabalhar no mercado digital é a ideia de que vai encontrar uma rotina flexível. Isso dá a entender que o trabalho depende 100% do criador de conteúdo, e que, por ele gerir a própria agenda, vai conseguir ter uma autonomia grande sobre o seu próprio trabalho.
Segundo Issaaf, é aqui que aparece um dos primeiros problemas nessa ideia de negócio. “Esse criador pode decidir trabalhar à noite porque é mais silencioso em casa, mas ele tem uma entrega para fazer que não é flexível, como todo mundo no mundo do trabalho. Toda a flexibilidade tem seus limites no mercado”, explica a pesquisadora.
Ainda que exista um controle dos horários de produção e de entrega, há um novo elemento nessa relação. Em geral, o criador desenha uma estratégia para fazer seu conteúdo ‘bombar nas redes’ levando em consideração um comportamento esperado do algoritmo. Só que a rede social nem sempre deixa esse plano se cumprir…
De acordo com Issaaf, as plataformas são, em certa medida, instáveis e podem mudar as regras a qualquer momento. Quando a gente ouve alguém falar que o algoritmo mudou, não é que a plataforma tenha caído ou não esteja funcionando. Não é nada disso.
Aqui um exemplo hipotético que ajuda a ilustrar o que ocorre:
- Vamos considerar que um post no feed de uma tal rede tem um resultado muito bom se vier acompanhado de um texto entre 500 e mil caracteres e se ele for postado na terça ou na quarta, entre 10h e 12h da manhã.
- O(a) criador(a) se planeja para seguir essa estratégia, mas seu conteúdo acaba não dando nenhum resultado.
- Depois de outras tentativas, a pessoa descobre que seu post não valeu nada porque a rede agora está dando visibilidade para publicações com menos texto e publicado às segundas ou sextas entre 15h e 17h.
- Mas, para descobrir isso, ela precisou testar e analisar muitos dados – seus e de outros usuários.
- Quando a nova receita do algoritmo é descoberta, e o(a) creator se planeja para, enfim, fazer seus posts bombarem, já é hora da rede mudar tudo outra vez. E aí precisa repetir o passo a passo acima.
É esse loop que tem um efeito nocivo na saúde de muitos produtores.
“À medida que a plataforma vai mudando, menos o criador de conteúdo tem pistas do que é que faz sentido ali, do que é que funciona e do que não funciona. A relação nem sempre é bilateral entre criadores e plataformas. Ele fica em uma condição de não saber exatamente o que vai acontecer – ainda que trabalhe ali, e ainda que seu trabalho seja imprescindível para as plataformas”, diz.
DE ONDE VEM A EXAUSTÃO?
A gente foi preparado para um mundo de trabalho que não se parece com a relação entre produtor de conteúdo e plataformas de mídia. Quando você é funcionário de uma empresa, por mais que você não tenha o poder de mudar as normas dela, você sabe quais são as regras e vai ter uma relação minimamente transparente com os gestores.
Os criadores de conteúdo não vivem isso. Eles trabalham dentro, com e para as plataformas, e, ainda que não percebam, não fazem nenhuma ideia de como se deve atuar naquele espaço, e o que significa ser bem sucedido ou não naquele lugar.
“A exaustão dos influenciadores tem uma característica muito particular, que é a exaustão dada pela rede social. Quanto mais veloz é o consumo de conteúdo dentro de uma plataforma, mais impactado com o anúncio publicitário somos”, diz Issaaf.
“Coisas como: é preciso fazer Stories x vezes por dia ou é preciso publicar sobre Barbie o mais rápido possível para não ficar velho. São ações que vêm de um imperativo da velocidade. Isso gera uma exaustão simplesmente pelo fato de trazer uma velocidade que não é humana.”
TEM COMO MUDAR ISSO?
Para a palestrante do FIRE, nomes que dependem menos das plataformas e que têm outras fontes de receita não ficam tão sujeitas a esse lado nocivo do trabalho.
“Eu acho que a diversificação do modelo de negócio é muito benéfico pensando na saúde mental. Eu não vou ser irresponsável de dizer que isso vale para quem está começando hoje e não tem equipe. Essa pessoa não consegue diversificar seu modelo de negócio porque precisa focar apenas em uma coisa. Mas há outros criadores crescendo, constituindo equipe, e que vão diversificando e se colocando em uma situação de menos dependência das plataformas”, comenta.
“Um caminho possível para isso, algo que tem tudo a ver com a Hotmart, é pensar como os criadores podem desenhar espaços em que o ritmo é ditado por eles mesmos”, defende. Entre as saídas alternativas, por exemplo, está a criação de uma comunidade com os seguidores. Ali, os creators estarão num espaço em que as regras e o ritmo vão ser definidas por eles mesmos.
FALTA POUCO
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